sábado, 21 de julho de 2012

O boi e o berrante







Quantas vezes você já ouviu (ou você mesmo disse) as seguintes frases: “Infelizmente o baiano não tem a cultura de ir ao teatro.” / “Adoro teatro, mas nunca vou.” / “Gosto muito de teatro, sempre que vou a São Paulo não perco um musical.”
Quando ouço essas frases, me dá uma vontade de... Mas continuo com cara de paisagem para não pesar o ambiente.
Em primeiro lugar, falta de cultura não é privilégio do baiano, mas um problema que viaja do Oiapoque ao Chuí e tem como base a falta de educação. Independente de classe social, somos um povo mal-educado. Se as pessoas são mal educadas desde a infância a consumirem bens culturais que não sejam produtos midiáticos, se não saem de casa para ir ao teatro porque tem muitas outras coisas que julgam mais interessantes fazer, estou fazendo teatro para quem e por quê?
Qualquer resposta que eu dê me parece que vai soar muito poética, e como ando numa fase pouco poética e muito objetiva, prefiro não responder e continuar trabalhando.
Acho que fazemos parte, em geral, de um gado que se move ao som do berrante. O berrante é a mídia. Para onde ela toca, o gado vai. Mas somos um gado metido, queremos que o berrante nos conduza para lugares que nos proporcionem sensação de status e poder.  Nesses lugares, não importa se o ingresso é caro – aliás, importa sim; se é caro, é bom, é para os privilegiados, tem que ser caro mesmo, divido no cartão – o que importa é poder estar lá e dizer que fui (não deixando de fazer o check in no Facebook, claro.)
Outra frase ótima de ouvir: “Quando estiver rolando uma peça boa, me avise, adoro teatro!”
Toda vez que ouço isso, sinto-me morador de uma cidade abandonada que espera o circo chegar. Vem cá, flor de mãe, já ouviu falar em caderno cultural? Guia cultural? Google??? Eu preciso me dar ao trabalho de lembrar de te ligar para recomendar uma peça – e sabe Deus se você irá?
Quanto você gasta em uma saída ao bar? À boate? Ao shopping? Pegue a calculadora. O ingresso do cinema já está 26 reais em 3D com 4 a 5 sessões por dia, todos os dias em salas que cabem mais de 300 pessoas.  Se encher a sala só com meia entrada, a renda semanal do filme será de mais de 130 mil reais (Uau!).
Vamos pensar num espetáculo teatral, que tem uma enorme equipe por trás trabalhando e precisando da bilheteria para receber seus cachês, a um ingresso de 50 reais de sexta a domingo com as mesmas 300 pessoas. Se encher de meia entrada, a renda semanal será de 22.500 reais. Quem faz teatro e consegue pelo menos um terço disto, levanta a mão!
Mas e daí, já tenho meus problemas, meu salário não é lá essas maravilhas, então vou chiar sim que o ingresso do teatro está caro, e vou ter que usar minha carteira falsa de meia para pagar 20 reais, então não sei se vale a pena, mas vou dividir em 6 vezes de 100 para pagar pelo abadá do próximo carnaval, chiando ou não. Ou farei questão de ir ver a peça dos globais montando um tal de Ibsen num TCA lotado e sairei com a certeza de que teatro é uma coisa meio chata mesmo.

RUGAS do Velho Chico: Chegança no povoado Alegre (vídeo)

RUGAS do Velho Chico: Chegança no povoado Alegre (vídeo)

Lindo o trabalho de vocês! Desejo-lhes perseverança e sucesso em sua jornada! Beijos, Vinnicius Morais.

domingo, 7 de março de 2010

FILOSOFIA DE VIDA ACME* (A que me tem direito)


“O que você viu naquele coelho?”

Pergunta o detetive Eddie Valiant à voluptuosa e siliconada Jessica Rabbit. Ao que ela responde:

“Ele me faz rir.”

Eu tinha uns oito anos quando “Uma cilada pra Roger Rabbit”, filme que mistura o mundo real com o desenho animado, me deixou fascinado.

Sonhava que a Desenholândia de fato existisse, pois os desenhos animados são mais divertidos, bonitos e fantásticos que o mundo real.

Lá, a bigorna cai na sua cabeça e você vê estrelas (ou passarinhos!) e logo em seguida continua intacto e serelepe.

Dar-me conta de que não, não, desenho animado é algo criado no papel (sou da era analógica, meu bem...) foi uma frustração para a criança que estava prestes a começar seu processo de descoberta de sua humanidade – e incontáveis limitações.

Cresci dizendo que possuía a síndrome de Roger Rabbit: “Gosto de fazer rir”. Era meu alívio, pois entre os garotos da minha idade eu me sentia mesmo um coelho...

Sempre teve um lado meu que insistiu em não “crescer”. Acreditar que posso desenhar a vida como a quero me tornou artista, me permitiu criança, me fez essência – de um frasco de perfume sem tampa, gosto de exalar-me para o mundo...

(Inventei de fazer poesia barata e depois de “exalar-me para o mundo...” estou sem saber para onde ir. Ainda bem que essa musiquinha do portal dá um embalo gostoooso... Dá vontade até de fazer uma yoga, beber leite Molico.)

Agora fui:

Dentre os milhões de aprendizados que tive na Biodança, destaco para o momento este: “Felicidade é uma opção.”

Costumo dizer que a tristeza entra na gente sem pedir licença, enquanto que a alegria é uma conquista. É esta conquista que realizo cada vez que faço o meu trabalho e este ajuda o outro a também ter seu momento de conquista – como é bom ver as pessoas saindo felizes da caixa mágica que é o teatro!

Superficial? Eu diria estratégico. Sabe aquela máxima de que com jeitinho se consegue tudo? (Pode não ser uma máxima, mas é o máximo, diga aí...)

Quando eu era bebê, minha mãe me fazia comer tudo que tinha no prato porque, a cada colherada, eu me divertia arremessando um objeto.

O que quero dizer com isso? É que através do humor, dá para fazer o outro comer chicória com gosto de chocolate, mesmo que meio amargo. Muitas piadas podem vir como lanças na nossa consciência...

E se rir é o melhor remédio, faço questão de receitá-lo a todos os meus pacientes amigos e espectadores, porque faço uso dele sempre e vos garanto: previne que eu chegue ao final do dia me sentindo apenas mais um na multidão.

Rir de mim mesmo permite minha criança descobrir que minha humanidade é capaz de incontáveis superações. Deixa meu mundo real mais bonito, divertido e fantástico. E, graças a Deus e a anos de terapia, não me sinto mais um coelho. Mas continuo fã do Roger.

“E por hoje é só, pessoal!”

*Pra quem não sabe, ACME é a marca de todos os produtos usados pelos personagens nos desenhos da Warner Bros. Bobinho!!!



Vinnicius Morais é roteirista de tv, autor de teatro, diretor teatral, ator, não é filósofo, não é médico, nem advogado, nem engenheiro, não adianta insistir. Tem vocação para go-go boy, mas isso só quem sabe são os amigos.

Quer conhecê-lo melhor? Nada de Orkut ou Msn, vá ver “Siricotico – Uma Comédia do Balacobaco”, escrita por ele em parceria com Lelo Filho, produzida pela Cia. Baiana de Patifaria, em cartaz no Teatro ISBA, Ondina, Salvador, de sexta a domingo às 20h.

E por favor, ria sem moderação.

04 de março de 2010.

domingo, 1 de junho de 2008

A prova do crime

CORREIO DA BAHIA, 07/02/2008:

Pela grama do canteiro central, foliões vencidos pelo cansaço e álcool dormem de qualquer jeito. Outros apenas sentam para poupar energias, visando aos arrastões de Brown e Ivete, como o diretor teatral Vinnicius Morais, 26, veterano de carnavais na Quarta-feira de Cinzas. “Eu voltava na contramão com Daniela (Mercury), mas ela abandonou a gente”, diz, revelando que o consumo de açaí é o segredo para se manter inteiro. Com ele, a atriz Simone Brault, 25, perdeu a conta de quantas vezes fez o trajeto. “Saí com o Asa (de Águia), vim até Ondina e fiquei voltando para encontrar os outros trios”, conta, lembrando que alcançou Armandinho, Margareth Menezes, Daniela e o DJ Fatboy Slim.

domingo, 10 de fevereiro de 2008

As Saturnálias Romanas



O TEXTO ABAIXO ORIGINOU O PRÓXIMO POST, "Saturnálias Carnavális".


Saturno, deus da agricultura dos antigos romanos, identificado como CRONOS pelos gregos, pregava a igualdade entre os homens e foi quem ensinou a arte da agricultura aos italianos. Também expulso do Olimpo, Saturno chegava com os primeiros sopros do calor da primavera e era saudado com festas e um período de liberação das convenções sociais. Durante as Saturnálias os escravos tomavam os lugares dos senhores. Não funcionavam os tribunais e as escolas. Os escravos saiam às ruas para comemorar a liberdade e a igualdade entre os homens, cantando e se divertindo em grande desordem. As casas eram lavadas, após os excessos libertários que aconteciam de 17 a 19 de dezembro (no hemisfério norte correspondia à entrada da primavera. Com a reforma do calendário e a inclusão de mais dois meses, julho e agosto, em homenagem aos imperadores romanos Júlio Cesar e Augusto foram empurrados para diante) seguiam-se a sua Purificação com as LUPERCAIS, festas celebradas em 15 de fevereiro, em homenagem ao deus Pã que matou a loba que aleitara os irmão Rômulo e Remo, fundadores de Roma. Os Lupercos, sacerdotes de Pã, saiam nús dos templos, banhados em sangue de cabra e depois lavados com leite e cobertos por uma capa de bode perseguiam as pessoas pelas ruas, batendo-lhes com uma correia. As virgens quando atingidas acreditavam se tornarem férteis e as grávidas, se tocadas, conseguiam livrar-se das dores do parto.
Suetônio conta que no tempo das Saturnais todos os participantes e os escravos podiam dizer verdades a seus senhores indo até ao extremo de ridicularizá-los do jeito que bem entendessem.

O filósofo alemão (FRIEDRICH) NIETZSCHE - 1844-1900 - em sua obra, O NASCIMENTO DA TRAGÉDIA, a respeito de DIONISO e APOLO, deuses opostos, entre o cáos e a ordem, faz um belo estudo sobre estes “mitos” e suas influências na vida humana, que regulam o equilíbrio entre as forças antagônicas e permitem um viver mais adequado. Para NIETZSCHE a arte é a única justificativa possível para o sofrimento humano, por isso combate a moral cristã que lhe parece fruto do ressentimento de frustados. Anticristão e ateu o escritor exalta a vontade de poder do grande indivíduo (super homem).
Justificando o posicionamento de NIETZSCHE, José Guilherme Merquior, em “Saudades do Carnaval” diz:

é fácil calcular a intensidade dos inconvenientes dessa atitude anti-natural quando a civilização racionalizada da Idade Moderna suprimiu justamente os pulmões carnavalescos da cultura. O Cristianismo da sociedade industrial, a religiosidade do tempo de NIETZSCHE não só havia negado e sufocado toda válvula orgiástica - toda composição sistemática com erros e carisma - como virara franca ideologia da sublimação ressurgida das massas aburguesadas , era nesse contexto, que a moral da renúncia significava repressividade absoluta, e repressividade doentia, “indecorosa” para usar a expressão do anti-cristo. O ascetismo vitoriano, a serviço da massificação repressiva, da “redução à mediocridade”,

de todas as dimensões morais do homem eis o que levou NIETZSCHE a um desmascaramento indignado do cristianismo”.

A visão de NIETZSCHE sobre o carnaval, em confronto com a do historiador e filósofo russo MIKHAIL BAKHTIN se aproximam, quando consideram que a festa é um rito coletivo onde foliões fantasiados e mascarados se transformam num “outro”, numa espécie de efeito catártico regulador do equilíbrio social.

O Carnaval é uma trégua, um alívio da hipocrisia social e do medo do corpo.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Saturnálias Carnavális


Acho interessante como é fácil ter um sentimento de nostalgia a épocas às quais não vivemos, como é fácil alimentar a visão poética sobre um tempo que ninguém viveu.

Li um texto sobre as Saturnálias, uma festa durante a qual os escravos saiam às ruas para comemorar a liberdade e a igualdade entre os homens, cantando e se divertindo em grande desordem.

Alguém entendeu bem que os ESCRAVOS saíam às ruas para comemorar a LIBERDADE e a IGUALDADE entre os homens???? ESCRAVOS comemorando a LIBERDADE???? A IGUALDADE????

Não, não entendi, alguém me explique e me dê uma taça de vinho, por favor (se beber, não dirija!).

Eles cantavam e se divertiam em grande DESORDEM. Mas era uma desordem pacífica, lúdica, resignada. No meio da multidão, nenhuma grega ciumenta arrancava o cabelo da outra porque esta deu em cima, entre vinhos e uvas, do seu marido. Nenhum escravo, revoltado por sua condição, praticava algum ato de vandalismo, entre vinhos, uvas e sangue de cabras, contra algum senhor. Afinal, ele comemorava, naqueles dias de "trégua", a igualdade e a liberdade, antes de retornar à sua edificante labuta de servir ao seu irmão, seu dono, seu igual.

Ainda bem que O Carnaval é uma trégua, um alívio da hipocrisia social e do medo do corpo...

Os graciosos Lupercos saíam NUS (a nudez é divina, não esqueçamos, mas eu não posso sair nu na Barra Ondina e nem queria também rsrsrs) e perseguiam as pessoas nas ruas, batendo-lhes com correias. Era algo tão lindo e poético, porque as virgens violentadas (ops!, quero dizer, TOCADAS) acreditavam se tornar férteis, e melhor ainda, naquela época não havia a delegacia da mulher. Então todos podiam brincar em paz. E valia a pena as grávidas serem tocadas também, porque, digam vocês, mulheres:

(Momento Enquete)

Se você pudesse escolher, qual dor não sentiria?

  1. A dor de uma correia que lhe corta a carne.
  2. A dor de uma criança que lhe corta a carne.

Na Roma Antiga, uma época em que homens usavam saia (oh, inveja!), era gostoso ir à arena com a família aos domingos e, entre vinhos e uvas (Se beber, não dirija!) assistir aos leões devorando seres humanos imprestáveis, iguais e livres a todos nós.

Mas hoje está tudo muito pior. Hoje temos o Bocão e outros freak shows, a tv nos mostra tudo, ficou muito sem-graça. Até o carnaval pode ser visto nessas caixinhas mágicas, e é muito mais seguro e desempolgante.

O carnaval de Salvador mistura gente demais. Eu, que moro no Alto do Itaigara, posso pular carnaval do lado do pobre miserável que mora nas Cajazeiras Infinitas, e pode, entre um Maimbê e outro, me assaltar.

Se eu não quiser passar por essa misturada nojenta e perigosa de classes, melhor me proteger dentro de um bloco, ou melhor, de um camarote, onde carnaval é a última coisa que alguém pensa em curtir. Mas não tem jeito, eu gosto da rua, eu gosto da mistura, então eu vou pular em desordem mesmo no meio de todo mundo, porque, graças a Deus e ao Guaraná Antártica, existem os trios independentes, sem cordas, onde comemoramos a igualdade e a liberdade entre os homens.


Mas sabe que eu considero que os blocos e os camarotes são estruturas que dão fim à hipocrisia social? Porque ali assumimos que não somos todos iguais, que queremos ser privilegiados por termos dinheiro, que não nos sentimos culpados se o irmão é pobre e quer roubar o que temos, e por isso é melhor deixá-lo se apertando na pipoca dando porrada uns nos outros. Quem não tem dinheiro que se arrisque aos socos e pontapés, ou se não quiser ou não gostar da bagunça, que fique em casa!

O carnaval é, e sempre foi, o período de soltar os bichos. Só que muitos desse bichos presos são selvagens e perigosos, porque o homem é obrigado a oprimi-los durante o resto do ano com focinheiras e jaulas enferrujadas. Aí, na hora que solta.... Tenha medo!

Coitado de quem pega um ônibus em dia de carnaval. Se você for clarinho, meu amigo, peça para seu anjo da guarda sair de trás do trio e voltar correndo pra te socorrer, porque os negros escravos (que porra de Lei Áurea, o quê????) aproveitam o CAOS instalado para comemorar a igualdade e a liberdade e descontar nesses bonitinhos o ódio que sentem por não terem um carro do ano com ar condicionado e vidro elétrico para poderem fechar quando vem o chato sujo pedindo "qualquer moeda, tio" e arrancar no sinal verde ao som de "Chicleteiro eu, chicleteira ela"!

Somos animais domesticados pelas regras sociais (e precisamos, de certa forma!), mas quanto maiores as desigualdades entre os homens, mais são alimentados o ódio e a violência, e não há período melhor para extravasar QUALQUER COISA do que o Carnaval. Entre cervejas, capetas, balas e hot dogs, homens e mulheres exalam vitalidade, sexualidade, criatividade, afetividade e transcendência, mas de repente o Chiclete passa e... PORRADA!!! SANGUE!!!!

No lugar das correias... facas! Revólveres! Mulheres inférteis e homens mutilados!

Um milhão de pessoas nas ruas! A periferia toda desceu, gente! Os assaltantes também querem pular carnaval conosco!!!! Os mauricinhos bombados metidos a valentões também estão à solta! As mulheres querem dar que nem umas loucas para tomarem a correia do dia seguinte distribuída pelo governo!

Está tudo muito perigoso. Está mesmo? Na verdade, sempre foi. O problema é que está mais. Porque a violência, o comportamento agressivo negativo, a ira e o ódio também moram dentro do homem. E quanto mais homens no mundo, mais diferenças entre eles, e mais ódio, inveja, etcetera e tal.

Felizmente, em contrapartida, também haverá sempre mais gente amando, dançando em rodas, gritando "Chame gente!" porque quer apenas "ser feliz e mais nada". È com elas que eu comungo alegria nas ruas todo ano, e o desejo de não voltar pra casa vitimado pela violência de qualquer tipo... Ah, mas isto eu faço todos os dias, então...


Tô indo pra Barra, galera!!!

Ah... mas Vinicius pode falar assim porque é homem, é grande... pode sair sozinho na rua no carnaval...

É verdade.

Então quem quiser sair comigo, é só ligar!

Quarta-feira somos eu e a Limpurb!